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(De momento sem hipótese de incluir uma imagem)

A ilha acaba onde a estrada termina. Um curto abismo que deixa o coração a bater mais forte traz a brisa marítima à ponta do olfacto perdido. Nos lábios, na boca toda, sente-se-lhe o sal. A terra naquele ponto dá lugar ao mar tocado pelo vento ameno. Mesmo em frente ergue-se um gigantesco rochedo irmão da ilha. Uma coisa tamanha que os olhos não conseguem abarcar na totalidade, e, ainda assim, pequena que ninguém lá habita para além das aves. Pedaços mais pequenos, rochas menores, aparecem à superfície criando em conjunto com as ondas um outro ritmo, como um homem que coxeia enquanto anda, quase dançante. E o ar é quente, e o ar é doce, e ar debaixo deste céu coberto de nuvens é feito de uma delicada filigrana que faz parte do nosso suspirar. Sopra um arejo de norte para sul que faz abanar as abas do meu chapéu, uma coisa sem importância que mereça outro reparo.
Ao fim de alguns dias na ilha estou tocado pela graça da sua natureza que me provocou uma insana distracção dos males do mundo. Reparei, por exemplo, nas pessoas com quem me cruzei, almas com quem já me tinha encontrado no café, no ponto de compra dos jornais com actualizações do dia de ontem, na entrada do hotel, na hora do pequeno-almoço pela manhã. Ficámos estreitos ao ponto de nos saudarmos em bons dias. Mas ninguém arriscou a perder a sua solidão singular. Numa ilha estamos entregues à nossa pele. Saudamos perdidos ao ver passar o nosso corpo de ilhéu emprestado nos passos dos outros.
Este espaço serve para respirar e para tomar o sabor do mar. Estamos impregnados pelo mar.
Passo o tempo que não estou entregue à caneta dos desenhos de mel a entrar pelo azul. Trago de lá um secreto sorriso de felicidade no rosto. Nada mais.
A água é transparente. O mar desaparece escuro na linha do horizonte. Vê-se o fundo e as nossas pernas tortas a caírem para o fundo arenoso. Quase não há pedras deste lado da ilha, apenas uma areia de cor amarela que aqui foi deixada para delícia dos que a pisam.
Vou um dia aqui voltar, tenho a certeza que voltarei a viajar para sul para me servir deste mar outra e outra vez.

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