50 (cinquenta)


Apanhei um susto naquele dia diferente, estou a contar-vos em primeira mão. Acreditem que fui surpreendido e que só não dei um salto maior para trás porque a cara se me fez torcida de espanto enquanto plantava as mão em sinal de defesa. Aquilo que era grande e que se encontrava no mesmo sítio há muitos anos e que fora o meu regalo desaparecera do meu universo emocional. Subitamente, apenas um vazio onde já reinara aquilo que ali estava. Ah!, Disse, depois de saltar para trás com as mãos a defender-me de qualquer coisa que só podia ter sido um fedorento traque do destino. De agora em diante um vazio amarelecido e desconfortante, uma espécie de mau-estar a roer-me a vista mesmo que a projectasse para outras distâncias, traidores, os olhos, levavam-me em tristeza para ali para onde já não estava aquilo que era o que era. Creiam-me que fiz ais de suspiro em forma de merengue branco e com caramilo na ponta. Creiam-me que dei voltas e voltas para botar no sítio outra coisa, mas em vão. Aceitem que vos diga que perdi o sono a pensar que não podia pensar mais naquilo. Mas sempre que entrava em casa olhava distraído para o tecto para não ver o nada que nem sequer se assemelhava ao que ali esteve por tantos e tantos anos, e nada. E o pior é que até o gato se despediu e saiu de casa. Fiquei apavorado, perdi peso e mergulhei no aquário do peixe para lá viver o resto da minha vida. O peixe tinha sido comido pelo gato deixando-me um oceano de vidro só para mim. Faço bolinhas de saliva que se desfazem na água rapidamente.

Comentários

Pló disse…
Confesso que os meus olhos não se tinham, ainda, empenhado na leitura destas escritas. Sem tempo, espreitavam oblíquos, de vez em quando, mais para ver os bonecos do que para olhar as palavras. Defeito de quem pensa em imagens e para imagens.
Hoje perdi-me nos labirintos desta escrita. E encontrei imagens. Por trás do suposto absurdo destes textos antevi a lógica da vida. De uma vida. Como todas ininteligível. Como todas logicamente absurda. E certa.
Hoje ganhei algum tempo ao deixar que os meus olhos se perdessem nas imagens tecidas pelas|nas palavras. E, de repente, apeteceu-me escrever.
Um beijo
Pló
Ena... fiquei sem palavras. Foram-se todas daqui, acho que fugiram para a vossa casa. Será que as palavras são como os gatos?

Beijinhos a todos.

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